O que você entende por inclusão?

. O QUE É INCLUSÃO 
É oportuno relembrar o que é o paradigma da inclusão, resumindo o que escrevi sobre ele nesta mesma revista (nºs 1, 11, 15, 17, 19, 23, 25, 26, 27, 29, 30, 64) e nos livros “Inclusão: Construindo uma sociedade para todos” (7.ed. Rio de Janeiro: WVA, 2006) e “Inclusão no lazer e turismo em busca da qualidade de vida” (São Paulo: Áurea, 2003). Inclusão, como um paradigma de sociedade, é o processo pelo qual os sistemas sociais comuns são tornados adequados para toda a diversidade humana - composta por etnia, raça, língua, nacionalidade, gênero, orientação sexual, deficiência e outros atributos - com a participação das próprias pessoas na formulação e execução dessas adequações.
 ACESSO X BARREIRA
A afirmação de que “Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção”, inserida na Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas (ONU, 1948), inspirou o combate às barreiras arquitetônicas nos últimos 50 anos do século 20 e nos anos iniciais do terceiro milênio. Ver o quadro “Breve História da Acessibilidade”, inserido após a Bibliografia no final deste artigo.
 DIMENSÕES DA ACESSIBILIDADE
Os exemplos de acesso serão, a seguir, inseridos em uma estrutura didática formada por seis dimensões da acessibilidade, descritas nos livros citados (2006, p. 67-69 e 102-103; e 2003, p. 39-42). As seis dimensões são: arquitetônica (sem barreiras físicas), comunicacional (sem barreiras na comunicação entre pessoas), metodológica (sem barreiras nos métodos e técnicas de lazer, trabalho, educação etc.), instrumental (sem barreiras instrumentos, ferramentas, utensílios etc.), programática (sem barreiras embutidas em políticas públicas, legislações, normas etc.) e atitudinal (sem preconceitos, 2 estereótipos, estigmas e discriminações nos comportamentos da sociedade para pessoas que têm deficiência). Portanto, a acessibilidade é uma qualidade, uma facilidade que desejamos ver e ter em todos os contextos e aspectos da atividade humana. Se a acessibilidade for (ou tiver sido) projetada sob os princípios do desenho universal, ela beneficia todas as pessoas, tenham ou não qualquer tipo de deficiência.
 O LUGAR DAS TECNOLOGIAS 
É preciso ressaltar que todos os tipos e sistemas de tecnologia, tais como tecnologias assistivas, tecnologias digitais, tecnologias de informação e comunicação, devem permear as seis dimensões da acessibilidade como suportes à realização de todos os direitos das pessoas com deficiência. Este imperativo está refletido em toda a extensão da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Por exemplo: “A fim de possibilitar às pessoas com deficiência viver de forma independente e participar plenamente de todos os aspectos da vida, os Estados Partes tomarão as medidas apropriadas para assegurar às pessoas com deficiência o acesso, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à informação e comunicação, inclusive aos sistemas e tecnologias da informação e comunicação, bem como a outros serviços e instalações abertos ao público ou de uso público, tanto na zona urbana como na rural.” (ONU, 2006). A legislação federal brasileira é rica em defender a provisão destas tecnologias: NBR 15290 (ABNT); Lei 10.098/00; Portaria Ministerial/MEC 3.284/03; Decreto 5.296/04; Portaria SEDH 170/04; Instrução Normativa SGPR 1/05; Portaria MEC 976/06; Portaria MC 310/06; Portaria SLT 3/07; Portaria SEDH 151/07; Decreto Legislativo 186/08. O QUE DIZ A CONSTITUIÇÃO FEDERAL a) É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar o direito à (...) educação (...), além de colocar as pessoas a salvo de toda forma de negligência e discriminação [via acessibilidade total]. Diz também que o Estado obedecerá ao preceito de facilitar o “acesso aos bens e serviços coletivos [por ex., bibliotecas], com a eliminação de preconceitos [via acessibilidade atitudinal] e obstáculos arquitetônicos [via acessibilidade arquitetônica]” (art. 227, § 1º, II). c) “A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público” [via acessibilidade arquitetônica] (art. 227, § 2º, e 244), portanto, incluindo as bibliotecas escolares.
 EXEMPLOS DE ACESSO DIMENSÃO ARQUITETÔNICA
No campo do lazer Acesso fácil nos aeroportos, terminais rodoviários, espaços urbanos, hotéis e similares, museus, teatros, transportes coletivos, parques ecológicos, parques temáticos, locais de eventos, acampamentos etc. No campo do trabalho Acesso fácil aos espaços físicos do local de trabalho, desde a entrada até as salas e oficinas de trabalho, sanitários adequados, meios de transporte acessível utilizados pelas empresas para seus funcionários. No campo da educação 3 Guias rebaixadas na calçada defronte à entrada da escola, caminhos em superfície acessível por todo o espaço físico dentro da escola, portas largas em todas as salas e demais recintos, sanitários largos, torneiras acessíveis, boa iluminação, boa ventilação, correta localização de mobílias e equipamentos etc. Implantação de amplos corredores com faixas indicativas de alto contraste, elevadores, rampas no trajeto para o recinto da biblioteca e áreas de circulação dentro dos espaços internos desse recinto entre as prateleiras e estantes, as mesas e cadeiras e os equipamentos (máquinas que ampliam letras de livros, jornais e revistas, computadores etc.). “Os sistemas de ensino, nos termos da Lei nº 10.098/2000 [Lei da Acessibilidade] e da Lei nº 10.172/2001 [Plano Nacional de Educação], devem assegurar a acessibilidade aos alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, mediante a eliminação de barreiras arquitetônicas urbanísticas, na edificação [dentro da qual existem bibliotecas] – incluindo instalações, equipamentos e mobiliário e nos transportes escolares [acessibilidade arquitetônica] (Resolução CNE/CEB nº 2, de 11/9/01, art. 12). “Para atender aos padrões mínimos estabelecidos com respeito à acessibilidade, deve ser realizada a adaptação das escolas existentes [acessibilidade arquitetônica] e condicionada a autorização de construção e funcionamento de novas escolas ao preenchimento dos requisitos de infraestrutura definidos [acessibilidade arquitetônica].” (Resolução CNE/CEB nº 2, de 11/9/01, art. 12, § 1º) “Os estabelecimentos de ensino de qualquer nível, etapa ou modalidade, públicos ou privados, proporcionarão condições de acesso e utilização de todos os seus ambientes ou compartimentos [acessibilidade arquitetônica] para pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, inclusive salas de aula, bibliotecas, auditórios, ginásios e instalações desportivas, laboratórios, áreas de lazer e sanitários.” (Decreto nº 5.296, de 2/12/04, art. 24) DIMENSÃO COMUNICACIONAL
No campo do lazer Adequação das sinalizações de locais (em atenção aos cegos e pessoas com baixa visão) e contratação de intérpretes da língua de sinais junto aos trabalhadores em serviços e locais de lazer. No campo do trabalho Total acessibilidade nas relações interpessoais: face-a-face, língua de sinais, linguagem corporal, linguagem gestual etc.), na comunicação escrita (jornal, revista, livro, carta, apostila etc., incluindo textos em braile, textos com letras ampliadas para quem tem baixa visão, notebook e outras tecnologias assistivas para comunicar) e na comunicação virtual (acessibilidade digital). No campo da educação Ensino de noções básicas da língua de sinais brasileira (Libras) para se comunicar com alunos surdos; ensino do braile e do sorobã para facilitar o aprendizado de alunos cegos; uso de letras em tamanho ampliado para facilitar a leitura para alunos com baixa visão; permissão para o uso de computadores de mesa e/ou notebooks para alunos com restrições motoras nas mãos; utilização de desenhos, fotos e figuras para facilitar a comunicação para alunos que tenham estilo visual de aprendizagem etc. 4 “Deve ser assegurada, no processo educativo de alunos que apresentam dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais educandos, a acessibilidade aos conteúdos curriculares [acessibilidade comunicacional, metodológica e instrumental] mediante a utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o sistema Braille [braile] e a língua de sinais... ” (Resolução CNE/CEB nº 2, de 11/9/01, art. 12, § 2º); – bem como de barreiras nas comunicações [acessibilidade comunicacional] (Resolução CNE/CEB nº 2, de 11/9/01, art. 12) Disponibilidade de pessoas que possam usar a língua de sinais brasileira (Libras); de auxiliares para orientação de pessoas cegas para localizar livros e outros materiais; disponibilidade de textos em braile, textos com letras ampliadas para quem tem baixa visão, recursos ópticos e não-ópticos, lupa, telelupas, barra de leitura livros falados, sorobã, vídeos com legendas e inserção de intérprete de Libras e outras centenas de recursos que facilitam a comunicação. Programa Incluir: Acessibilidade na Educação Superior, criado pela Portaria Normativa 14, 24/4/07, do Ministério da Educação

 BREVE HISTÓRIA DA ACESSIBILIDADE
 Romeu Kazumi Sassaki Anos 50: Profissionais de reabilitação denunciam a existência de barreiras físicas nos espaços urbanos, edifícios e meios de transporte coletivo que impediam ou dificultavam a locomoção de pessoas com deficiência. Anos 60: Universidades americanas iniciaram a eliminação das barreiras arquitetônicas existentes em seus recintos: áreas externas, estacionamentos, salas de aula, laboratórios, bibliotecas, lanchonetes etc. Anos 70: Surgimento do primeiro centro de vida independente (CVI) do mundo em Berkeley, Califórnia, EUA, e de centenas de CVIs impulsionou o exercício da independência (tomada de decisões) e da autonomia (funcionalidade) de pessoas com deficiência. Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes: “As pessoas deficientes, qualquer que seja a origem, natureza e gravidade de suas deficiências, têm os mesmos direitos fundamentais que seus concidadãos da mesma idade” (ONU, 1975). Anos 80: Lema “Participação Plena e Igualdade” do Ano Internacional das Pessoas Deficientes (1981) levou pessoas com deficiência a desencadearem campanhas mundiais para alertar a sociedade a respeito das barreiras arquitetônicas e exigir não apenas a eliminação delas (através do desenho adaptável) como também a não-inserção de barreiras já nos projetos arquitetônicos (através do desenho acessível). Declaração de Cave Hill: “Todas as barreiras que impeçam a igualdade de oportunidades devem ser removidas.” (Disabled Peoples’ International, 1983). Programa Mundial de Ação relativo às Pessoas com Deficiência: “Os Países-Membros devem trabalhar em prol de um ambiente físico acessível para todos, abrangendo as pessoas com vários tipos de deficiência.” (ONU, 1983). Anos 90: Surgimento do conceito de desenho universal (ambientes, meios de transporte e utensílios devem ser projetados para todos), do paradigma da inclusão e da visão de diversidade humana – ampliando o conceito de acessibilidade para abranger dimensões arquitetônicas, comunicacionais, atitudinais etc. Normas sobre a Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Deficiência: “Os Países-Membros devem iniciar medidas que removam os obstáculos à participação no ambiente físico. Tais medidas devem desenvolver padrões e diretrizes e considerar a promulgação de leis para garantir a acessibilidade a várias áreas da sociedade, tais como moradia, edifícios, serviços de transportes públicos e outros meios de transporte, ruas e outros ambientes externos.” (ONU, 1993). Carta para o Terceiro Milênio: “O século 20 demonstrou que, com inventividade e engenhosidade, é possível estender o acesso a todos os recursos da comunidade - ambientes físicos, sociais e culturais. No século 21, nós precisamos estender este acesso - que poucos têm - para muitos, eliminando todas as barreiras ambientais que se interponham à plena inclusão deles na vida comunitária.” (Rehabilitation International, 1999). Século 21: Longa luta pelo direito de ir-e-vir se incorpora à defesa de todos os direitos humanos. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: Do tema “acessibilidade” se ocupa todo o Artigo 9, mas ele aparece também em diversas outras partes (ONU, 2006).

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